domingo, 14 de outubro de 2012

Da Cegueira (auto imposta)

   Ele tateou no escuro do quarto pelo seu óculos perdido em algum lugar do criado-mudo. Achou-o e, ainda que o estivesse procurando, sobressaltou-se com o toque frio das lentes. Era um desses dias que considerava tal acessório terrível. Pegou o objeto do seu medo cuidando para que o manchasse com os dedos. Imprimindo, desta forma, no vidro - "Cristal!", diria o oculista - suas digitais. 
   Levantou-se da cama cego e sereno, ainda com ele nas mãos. Caminhou com cuidado pelo breu em direção do interruptor tropeçando nos próprios chinelos, trapos e móveis. Ao alcançá-lo, segurou o óculos frente ao rosto para baforejar as lentes, embaçando-as ainda mais. Somente quando o colocou na cara ligou a luz, desta forma não corria o risco de enxergar.
-Tem dias que eu prefiro ser cego. Dias em que ignorar o que há ao meu redor é necessário se pretendo manter certa sanidade mental.- Explicou a si mesmo.
   No dia seguinte ele ainda se encontrava no breu do dia anterior, mesmo depois de ligada a luz.