domingo, 6 de dezembro de 2009

Joana.




Ela sabia exatamente o que fazer e quando fazer. Alta, pele num tom pálido do negro e esbelta; sobre-humanamente esbelta e somente nos lugares certos. Ela era mais bela que qualquer deusa grega, alias qualquer deusa perto dela passaria por monstro. Ela era algo mais do que, até mesmo, as modelos da Victoria Secret. Havia algo de indecente inclusive em como os homens, e algumas mulheres, falavam seu nome: Vanessa! era como se gritassem "Eureca!"

Mas ela não era só um rostinho bonito, não! Era, também, incrívelmente bem sucedida, e com isso quero dizer: rica. Não era casada e tinha um filho de 14 anos, imaginem então quantos anos ELA tinha, mesmo com aquele corpo...

Joana, irmã da Vanessa, tinha inveja dela. Impossível, não? E a odiava, por assim dizer. Ela era, de modo insuportável para nossa época, gorda, tinha um marido, dois ex-maridos e cinco filhos. Sobrevivia com o pouco dinheiro da pensão dos "ex`s", o salário de professor de seu "atual" e dos sacolés que vendia.

Um dia Joana, fudida financeiramente, se viu quase obrigada a pedir ajuda a sua irmã. Essa, por sua vez, a recebeu muito bem em sua cobertura de frente pro mar no Leblon. Joana queria ser direta no assunto: "Estou fudida, preciso de dinheiro.", mas Vanessa botou Chico Buarque pra tocar -Ah, Chico!- e trouxe vinho tinto seco para beberem.

A garrafa era cara e quase secular. As duas bebiam, bebiam e bebiam, mas, como sempre, Vanessa era superior e manteve-se sóbria, Joana não... Finalmente conseguiu dizer o que foi dizer, em meio a soluços e risos fora de hora, mas disse.

Porém, em meio aos mesmos soluços e risos, outras coisas fugiram de sua boca. As verdades inconvenientes citadas no começo saíram em forma de ofensa, sendo isso possível ou não.

Como era de se imaginar, Joana saiu do estupendo prédio real de Vanessa sem dinheiro suficiente para a passagem e teve de voltar, para seu barraco na Zona Norte a pé, na maior parte do trajeto. Ainda bêbada, é claro.

Porém ela conseguiu se safar. Um de seus ex-maridos, um contador, tinha ações de uma pequena empresa na bolsa que se tornaram maravilhosamente caras depois de apenas três anos, quando essa empresa cresceu. O ex-contador largou a magrela com quem estava para voltar para Joana que largou o ex-atual pelo dinheiro,  mesmo sem saber se ele voltou por ela ou pelos dois filhos.

 Enquanto a vida de Joana melhorava a de Vanessa piorava. Sua empresa estava passando por "tempos ruins", mas o que estava realmente a incomodando era a enorme espinha que aparecera na ponta de seu perfeito nariz.

Joana, percebendo o estado em que a empresa de Vanessa se encontrava, comprou pra si, pra seu marido e pra seu filho mais velho, que havia a pouco feito vinte anos, ações suficientes da empresa para comandar a mesma. É claro que isso não traria lucro algum, mas era de vingança que corria atrás. A doce vingança.

Nos anos seguintes a imortalmente bela Vanessa tornou-se escrava de sua irmã na empresa, ou secretária se preferem eufemismos. Mas seu talento não a deixou e logo ela conseguiu um ótimo emprego numa outra empresa em ascensão.

Joana, dando-se conta de que nunca teria sua vingança, caiu em depressão. Ninguém a fazia andar, comer ou se olhar no espelho e, um dia, ela tomou veneno pra rato como a boa peste que considerava ser.

Morreu rica e estupendamente magra. Imbecil.

Texto de: Edson.

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